CORRENTE DE INRUSH: O QUE VOCÊ PODE (E DEVE) FAZER PARA LIDAR COM ELA

Pelas razões anteriormente apontadas, a garantida eliminação completa da existência da corrente de Inrush é quase que impossível. Alternativamente, conviver com um certo grau de Inrush tem sido a melhor saída. Para isso, os dispositivos que permitem uma reduzida manifestação da corrente de Inrush são invariavelmente caros e, por isso, usados em casos muito específicos, na energização de transformadores e reatores de elevadas potências.

O começo

Por exemplo, um dispositivo cujo sincronismo permite energizar cada uma das fases quando a posição da senóide da tensão a ser aplicada estiver no pico positivo. Neste caso, a incerteza fica por conta do fluxo residual, que apresenta valores bem imprevisíveis, podendo ainda ter sinal diferente, em cada uma das colunas do núcleo.

Nos casos em que um grau relativamente maior de Inrush pode ser tolerado, há os relés de sequência negativa, microprocessados, que, através da detecção da presença do segundo harmônico de corrente, distinguem a corrente de Inrush da corrente de curto-circuito. Em todo o caso e apesar do preço ainda relativamente alto dessas soluções, o projeto mecânico do transformador deve ainda prever uma suportabilidade adequada para um grau de esforços que os elementos internos irão inevitavelmente sofrer.

Essencialmente, as formas de se reduzir a intensidade da corrente de Inrush podem se basear em dois elementos importantes.

O primeiro deles é como o fluxo magnético se estabelece, num enrolamento contendo núcleo ferromagnético, quando alimentado por tensão senoidal. Para isso, duas expressões são essenciais, sendo a primeira dela mais conceitual:

Na qual  corresponde ao valor de pico do fluxo magnético, em operação,  é valor máximo da indução de operação e A é o valor da área da seção transversal do núcleo.

Por sua vez, a segunda expressão é mais dedutiva, tendo grande importância nos projetos de transformadores :

Essa segunda expressão nos mostra que o valor máximo da indução de operação, vai depender do valor eficaz da tensão aplicada, de forma diretamente proporcional, bem como do valor da área da seção transversal do núcleo, A, só que de forma inversamente proporcional. Isso, claro, considerando que a frequência, f, e número de espiras, N, estejam fixos, tal como na grande maioria dos casos.

E o segundo elemento a se considerar é a curva de magnetização, ou de saturação, do aço utilizado no projeto do núcleo. Essa curva é muitas das vezes representada pela indução versus o campo magnético, tal como mostrado, de forma genérica no gráfico da Figura 1,  abaixo.

Figura 1 – Curva genérica de magnetização de um aço utilizado em núcleo de transformador – Indução versus campo magnético

Alternativamente, a curva de magnetização pode se apresentar na forma de indução versus perdas no núcleo, por exemplo, dentre outras.

Mas, de acordo com o gráfico da Figura 1, o mais importante é notar que o projetista deve escolher um valor máximo de indução, para operação, de acordo com a expressão (2), que vai definir um ponto de operação na curva.

Por exemplo, o ponto P1, relativamente afastado da região de saturação magnética do núcleo, representa a escolha por um valor operacional de indução relativamente baixo, permitindo que uma eventual combinação dos fluxos de energização e residual não possibilite atingir uma saturação magnética significativa e, portanto, a corrente de Inrush não dispare.

Tal expectativa não é mesma para o caso de se desejar operar no ponto P2, já na região de saturação magnética e, portanto, muito mais suscetível à ocorrência da corrente Inrush, na energização. Entretanto, no aspecto econômico, os papéis se invertem. O ponto P1 significa um desperdício de material de aço, por conta de sua subutilização. Ao contrário a escolha pelo ponto P2 vai representar um máximo aproveitamento dessa commodity. Enfim, mais um “curto cobertor” que “cobre a cabeça, mas descobre os pés”, como sempre a Engenharia nos oferece.

Endereçando a solução

Cabe, então, ao projetista, escolher em que ponto operar, na região entre P1 e P2, sendo que esta não é uma escolha fixa para todos os projetos. Vai depender de vários fatores, sendo a filosofia da empresa fabricante a principal delas, capaz de orientar o compromisso entre o custo do aço e da manifestação do Inrush. Isso sem contar que a escolha de um determinado valor de indução vai implicar em outros fatores, tais como variação do valor das perdas em vazio, variação do valor da indutância de dispersão (por contra das distâncias radiais associadas à área do núcleo) e de ainda outros fatores, de igual importância, que muitas das vezes precisam ter seus valores garantidos. Um desafio, sem dúvidas.

Nesta altura, como uma importante ferramenta para o projetista, o uso de uma solução de projetos surge como uma “tábua de salvação”, permitindo ao projetista simular alternativas até chegar a um projeto mais otimizado.

Não obstante, é importante que o projetista tenha certeza de que seus dados lançados na simulação são confiáveis. Por isso, é importante ter certeza quanto à curva de magnetização do aço utilizado. Variações nos lotes de bobinas de aço podem ter consequências indesejáveis. Ainda, é importante que o projetista tenha plena confiança no processo de fabricação do transformador. Principalmente, quanto aos processos de corte, de eventuais recozimentos e de montagem das lâminas de aço do circuito magnético, passando até pela armazenagem do material. Tudo interfere para que os dados inseridos nas simulações possam não ser aqueles esperados.

Como pode ser visto na imagem a seguir, todas as variantes envolvidas no processo de cálculo da corrente de Inrush, devem estar interagindo entre si, de uma maneira que o projetista tenha rapidamente o resultado e possa assim testar diferentes possibilidades no projeto até atingir o ponto ideal de balanço entre custo e eficiência.

Imagem do SISRECWEB

Finalmente, cabe mencionar que eliminação do Inrush pode ser também conseguida com a redução da tensão aplicada na energização e seu aumento gradativo, em seguida, até atingir o valor nominal.

Mas, invariavelmente, não há formas práticas e economicamente viáveis de se implementar metodologias assim.

Daí, artifícios utilizados em partidas de motores, como a chave estrela-triângulo, inversor de frequência e softstarter não se aplicam, entretanto. Isso porque a variação de tensão que os dois primeiros permitem seria repassada às cargas ligadas no secundário do  transformador, causando transtornos por conta de possíveis queimas de equipamentos.

Já o softstarter, por “picotar” a onda de tensão, como princípio de funcionamento, iria não só danificar as cargas como trazer solicitações de tensão extremamente danosas para os enrolamentos do transformador.

Enfim, conviver com a corrente de Inrush tem lá suas particularidades, cabe ao projetista testar as diferentes possibilidades até encontrar o melhor ponto de equilíbrio entre custo e eficiência.

One thought on “CORRENTE DE INRUSH: O QUE VOCÊ PODE (E DEVE) FAZER PARA LIDAR COM ELA

  1. Existe um procedimento de rede do ONS que que torna obrigatório a presença de dispositivos nos disjuntores para atenuar os efeitos da corrente de inrusch na energização de transformadores. Alguém poderia fazer comentários sobre a eficácia da presença desses dispositivos ( controladores de manobras ou resistores de pre- insercao)

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